viernes, 13 de junio de 2008

Meu Fado, meu Tango

Uma destas noites fomos ao Noutorius.
E voltei a descobrir Buenos Aires – a sesta já ia larga! Maravilhosa quotidianiedade, tudo bem, mas toca calçar os sapatos e calcorrear um pouco mais esta Movida, que ainda tem muito alimento a dar ao Espanto, e afinal, o puto chinês quase já anda sozinho!
O nome era meio duvidoso – Karina Beorlegui -, mas o panfleto que a anunciava, dizia o seguinte:
‘’El Fado es al Tango como Lisboa a Buenos Aires. Nacieron para la misma epoca, en los distintos puertos, y tienen ese aire de nostalgia, tanto en lo poetico como en lo musical…’’
Sim. Sao chorados da mesma forma, desgarrados com as mesmas palavras de rua, humor callejero, e nos dois os desamores, as partidas, o amor a si mesmos (‘ai o tango’ se tangueia, ‘ai o fado’ se fadeia…), a Tristeza encarada com trágica naturalidade, e afinal, em nome da Canção, ela tem um sentido, e até um certo regozijo.
Mas más allá da verdade – ou não – destas palavras, nada me preparou para o que ia ouvir.
A minha expectativa de um tango com alguns rasgos a lembrar guitarra portuguesa, chocou de frente com a primeira nota cantada pela pequena do microfone.
Uma Casa Portuguesa.
Uma argentina a cantar no Português mais polido que tinha. Uma argentina de sangue a cantar fado com a alma. E aparte algumas sílabas mais difíceis, em que se desmascarava a argentinidade de origem, aí estava ela – a cantora – e aí estava ele – o fado. Em Português.
Entre um Tango e um Fado, metia-se com as mesas (num estilo muito Maia Vares), pedia aprovação às portuguesas presentes – eu e a Marta -, arrancou uns amigos da assistência para o banco do piano, num género improvisado; da profunda e quase solene entrega com que cantava rapidamente descia à terra com risadas espontâneas e macacadas de miúda pequena.
E bom, entre um tango e um fado, meu coração balançava.
Bom, não relativizemos tanto, um tango é um tango (puff…..) e um fado é o Meu fado.
Quase me ponho a chorar com as primeiras palavras em português – recordo que desde Dezembro não tengo comunicação diária em português, e o castellano tomou lugar (perguntem a minha mãezinha como me ouve ‘falablar’, dá vergonha ao dicionário).
E o fado… É Fado. E mais o é quando se está longe (não é Miguelinho? Parece coisa de sangue!)
Bom, e já que estamos entre Fados e Tangos, saibam que dia 11 de Junio, a celebrar o dia de Portugal, a Embaixada convidou a um bom Fado, com direito a levar amigos – ‘’vejam, isto é o que eu sou.’’
O xaile, a mão no peito, a guitarra familiar, os fados que tocam na pele e nas Saudades, a voz falada em português ao publico. ‘’Esta aí a Gente do meu Povo?’’ Sim, estamos. Bebendo as palavras e as letras tão nossas. Ela prometeu-nos dar-nos um bocadinho ‘’dos sons, das formas, dos cheiros, do sal’’ de Portugal… E cumpriu.
Saudade.
Terminamos a noite no El Cuartito da esquina, entre pizzas caseiras e brindes de cerveja de pressão. A minha frente, sentou-se a rapariga que tinha ouvido cantar a noite anterior – acham que ela ia perder isto??
Falamos toda a noite, sobre o Tango e o Fado, o meu, o dela, e os nossos.

E por falar nisso, voltei ao Tango.

2 comentarios:

MFA dijo...

O que eu acho extraordinário é que parece que sinto em ti qualquer coisa que será talvez comum a todos os emigrantes, a tal Saudade da Terra, a comoção da língua, a nostalgia da Pátria , a lágrima fácil ao som da melopeia bimbo-sentimental que eu na minha insensibilidade de portuguesa bem instalada e agarrada ao torrão natal, considerava apanágio das Lindas de Susa, e dos "vacansas". Choras por bacalhau? Começo a perceber porque é que os cantores portugueses têm tanto sucesso junto das comunidades luso-estrangeiradas. Um beijo lusíada.

Anónimo dijo...

Ainda noutro dia confessaste-me que já cozinhavas (Duvidoso!!)… Hoje ao ler achei até à última letra que ias descrever um fado saudoso cantado por ti… Era o cumulo da Ficção Cientifica!!!
Bjs