viernes, 31 de agosto de 2007

actualização de alguns feitos

I - a Faculdade.


A faculdade!! Finalmente ganhei coragem e fui enfim às aulas. Que apesar de (para quem bem me conhece e bem gozou!) normalmente por fins de Agosto eu estar já em parafuso, pela desocupação (bichinho workaholic em ebulição), a verdade é que a saída de Vila Nova e de muitas boas últimas noites e jantaradas, dos chinelos e da preguiçosa praia, para cair em plena altura de regresso às aulas e num Inverno mais rigoroso que Buenos Aires conhece (e eu própria) foi queda abrupta. O primeiro esforço físico e mental foi tirar da mala as luvas, os cachecóis, as lãs. Sair de casa e apanhar chuva desprevenida, arrepender-me de não ter vestido mais uma camisola, de não ter trazido as botas de Inverno, estranhar o vento gelado quando ainda tenho a barriga bronzeada (que o resto já retomou a cor normal, para minha infelicidade)!
O segundo passo foram as aulas. Que começavam no dia a seguir à minha chegada, mas com a confusão com que ela aconteceu, foram inexistentes até à semana seguinte. Alquiller tratado, dinheiro em caixa, camas compradas e pés assentes (??), lá fui à faculdade.
Como tudo aqui... gigante. Entrei deliciada com o frenético ambiente de “regresso às aulas”, as politiquices típicas de uma Faculdade de direito, que nos primeiros dias do ano ainda tem fresco o ânimo reivindicativo (cartazes por todo o lado, parece que por aqui também vão acontecer algumas reformas), de metro a metro, mil mãos a distribuir panfletos (de fotocópias, de teatros, de politicas e listas académicas, de jornais universitários...). As salas das cadeiras são anunciadas também por panfletos, nos semáforos da última passadeira até à porta da universidade, e se me apanhassem de humor mais fechado, não teria estendido a mão ao dito papel, e tinha-me perdido mais do que aconteceu.
A Faculdade é gigante, e a primeira hora que lá estive foi totalmente perdida nos corredores cheios de gente e livros e folhas (sim, e panfletos também, again por todo o lado).
Escadas, andares, bares, escadas, salas e salas e salas a perder nas contas. Por fora, é um edifico imponente, ao estilo antigo, quase romano, com umas colunas gigantes. Por dentro é um labirinto, uma multidão, e antigo também, mas mais ao jeito de velho e menos de antiguidade. Mas muito faculdade. E muito Direito, porque em todo o lado há livrarias, fotocópias, bibliotecas, nerds e cartazes reivindicativos.
Tão grande que nem as pessoas (metade delas) sabiam onde raio era o departamento de relações internacionais, para me inscrever.
Inscrição bem sucedida, zarpei para casa a tratar da lide doméstica (meaning, comprar as ditas “camas”, item básico à sobrevivência).
Inscrevi-me em 4 cadeiras (que para eles é uma loucura, porque o máximo para locais é 3. Parece que o método por aqui passa por poucas aulas, horário liberto – muitos trabalham, para não dizer quase todos -, e sobretudo ler, ler, ler. Em casa, e tudo o que se puder. Num registo quase autodidacta), e a descrição que se segue vai para os meus queridos companheiros juristas, que saberão do que estou a falar: Elementos de Derecho Comercial; derecho politico y electoral; derecho internacional privado; e, por capricho e vontade de saber um bocadinho, Historia de las ideas, conflictos y politicas de Argentina. Não tenho aulas as 3f e 6f, bem bom para fazer fins de semana prolongados, a viajar por esses confins.
Quarta-feira, dia 22 (grande dia, já devidamente assinalado!), lá fui eu para a minha primeira aula, e o resto da semana foi irrepreensível! Algumas primeiras impressões, mas guardo-me para posteriores escrituras, que não quero cansar-vos (ou a mim), com excesso de informação!
Fica a dica, para gentes da Clássica, que aqui não há teóricas. Todas as aulas são em salas pequenas, com bancos de madeira corridos e paredes sem cor, e há tantas cadeiras e tantos horários (só de comercial podia escolher entre cerca de 30 horários e professores diferentes, e a lista de cadeiras é infindável!) que tenho uma cadeira com doze alunos! Só quando a aula acaba e volto aos corredores é que volto a cair na imensidão da Faculdade!
E agora, aulas a preparar, fotocopias, livros para comprar, estudar já... Meio violento, mas bem ao jeito que eu gosto!











II - Gentes

O segundo acontecimento da semana obrigou-me a calar alguns escritos já em espera de serem publicados, sobre o estranho que estava a ser, apesar de me parecerem bons estes ares, não ter aqui as minhas pessoas e os meus lugares. Não estou a falar de vocês ou dos meus jardins de príncipes reais por aí - claro que é estranho não ter tudo isso. Mas estou a falar de (não) ter aqui, em Buenos Aires, gentes minhas, laços meus, cafés combinados, estar, só estar. Lugares também não. O Jardim onde me apetece passear, o bom café matinal, o sítio barato, o sítio bom, e o café-lugar (Maria Inês sempre aprendi alguma coisa contigo!). Não já só o fascínio da Cidade. Espalhei-me por folhas e folhas sobre a sensação de não pertencer ainda aqui. De estar cá a apalpar terreno ainda, de não ainda a mensagem à mão do “bora fazer qualquer coisa”, mas apenas o “de onde és e o que fazes aqui” inicial. Dando o desconto do pouco tempo que aqui estava, mas ansiando por mais qualquer coisa que esse gerúndio. Que esse “ir conhecendo”, ir “estando”.
Bastaram dois ou três programas gerais de Erasmus para nascer alguma cumplicidade e um extraordinário à vontade que deu lugar, agora, a encontros vários a toda a hora, cafezadas, jantarinhos só porque sim, cinema, enfim, o dia-a-dia normal e excepcional que temos com as nossas pessoas. As minhas, de cá, agora.
O ponto de arranque foi a noite de Tango – já tinha dito que fui ao Campeonato Mundial de Tango?, entradas grátis, levantadas no próprio dia, 10 pares de cada vez a dançar o melhor tango do Mundo -, onde voltei a perceber o porquê da minha fixação no dito. O 1º programa dos Erasmus da minha faculdade! Os sobreviventes a 4 horas de tango partiram para minha casa, a fazer tempo até ser hora de rumar a um barzinho, e acabou por ser esse mesmo o programa, porque as mensagens do “vem cá ter” foram rolando, a campainha ia cantando a cada minuto, e num instante juntou-se ali uma malta que bem podia representar as Nações Unidas: Portugal, Espanha, França, Chile, Argentina, Brasil, EUA, Inglaterra, Hawai...
Rolaram musica, copos ligeiros, conversas, apresentações, a melhor disposição, piadas e fotografias. Foi uma animação, e um sopro de descompressão. Para mim, que estava a precisar de gente na minha vida por aqui, e para os meus Anjos, que estão de férias há duas semanas, meaning ausência de frequente convívio com a colegagem da faculdade (dito na secretaria da faculdade de Engenharia: “Isto aqui não é como na Europa, aqui é tudo uma confusão!”; significado: vamos estar de greve nos próximos dias!).
Bem, daqui vieram programas a toda a hora, mensagens diárias e comunicação rotineira, projectos de viagens, e muito boas perspectivas de um ano para a frente!



ps: estou em colecta de fotografias para apresentar com toda a pompa e circunstancia a malta daqui! Para breve!!







III - 3as feiras



Terça-feira. Dia de pausa de uma 2ªf muito cansativa (não são sempre?), dia sem classes, e portanto, combinação daqui para a frente, promessa de sangue entre maltas de Erasmus, dia de passeio. Como as visitas de estudo do jardim-escola. Passo portanto a informar que passarei a ter uma crónica semanal turisto-cultural. Ena, ena!!



A estreia deste ambicioso projecto tinha o bairro La Boca em vista, a imagem de marca de BsAs (logo a seguir ao tango e em estrito empate com as parrillas - meaning carne, carne, carne!), as tais casinhas coloridas que aparecem em todos os postais. Comecei com a ideia genial de ir até ao ponto de encontro a pé -onde cheguei duas horas depois (e no mapa parecia já ali...). Mas acabou por saber lindamente, porque se aqui tudo é grande, tudo é plano também - e se Lisboa assim fosse, faria Marquês-Queluz (seja lá onde isso fique) com igual leveza. 5 km de Avenida (a minha preferida, a de Santa Fé), a bom passo, o tal apressado a que estas avenidas obrigam, boa pressa! Conheci no seu fim a great Plaza de San Martin (herói muito bem tido destas bandas, vou averiguar a história e depois conto), tão familiarmente europeia que bem podia estar em Madrid.



Abro parentesis nestas andanças, a propósito disso, e do que minha querida mãe tinha também já perguntado, para dizer que estou a ter uma classe interessantíssima sobre História da Argentina, e que nas primeiras aulas falámos muito da consolidação do Estado e do programa de 80. Passo a contextualizar: a Argentina é como um puzzle. Como faz sentido pensar, tendo sido colonizada por outros povos e outras culturas, a mescla é um dado óbvio e não estou a adiantar nada. Mas vai um bocadinho mais longe do que isso. Há aqui algum complexo em relação à Europa, e algum sintoma de "amiga-feia-que-copia-amiga-gira". Com a estupidez inerente ao facto da Argentina ser lindíssima, mas algum sentido sentido na busca de desenvolvimento e evolução onde eles já existem. Então o Programa de 80 foi buscar a alguns países na Europa os melhores modelos em cada área. Por exemplo, militarmente, a Prússia (até os uniformes eram parecidos); e claro, culturalmente, a França (creio que a palavra utilizada pelo Prof. foi mesmo obsessão). Depois de uma hora e meia de aula, pareceu fácil perceber o deja vu europeu de Buenos Aires.
Em resposta à sua pergunta, madre mia, e apesar de não me lembrar de Paris, sim, aqui há Paris (não por acaso que chamam a BsAs "a Paris da América Latina"), e também Madrid, e até Londres. Curiosamente, não há Lisboa, mas isso talvez porque a conheço demasiado bem, porque de facto Lisboa é um género de capital europeia muito próprio, autoinventado. Lisboa só nas gentes.



Continuando o passeio, continuei calcorreando a Florida, por mais uma hora de passeio solto. Passeio pedonal, estendido também por kms, muito turistica e comercial nas lojas, mas sem perder o género Mi Buenos Aires Querido (nome de um tango conhecidíssimo), na multidão em hora de ponta, dos trabalhadores argentinos que pareciam fazer tudo menos trabalhar porque enchem as ruas com as suas gravatas, os saltos, as conversas em voz alta ao telemóvel.



Acabei no dito La Boca, o bairro pobre da cidade, a cair de podre e de sujo e de velho, mas com uns salpicos de sentido de humor nas casas amarelas, encarnadas, azuis. O Rodrigo (TDP, Tuga De Passagem) que está a fazer a minha dulce viagem de sonho por esta América, explicou-me o porquê: o barrio fica ao lado de um porto fantasma, com barcos, garrafas e pnes encalhados, presos no lodo. E anos antes destes nossos, as maltas cá do sítio aproveitavam madeiras e tintas dos barcos perdidos, presos, partidos, para construir as casas. Assim, todo um bairro com ar de barquinho de pescador. As casas são da cor dos barcos e assim acabou La Boca sendo o bairro apetitoso que é, para quem consegue (como qualquer bom turista) ter o cinismo de virar a cara às casas podres, aos cães rafeiros, ao cheiro, aos homens sem banho.


O ponto alto desse cinismo é El Caminito, à letra e na realidade também, um caminhito, i.é, meia quadra de rua, com as casas impecavelmente retocadas na pintura sem mancha; e de repente parece que por dois segundos se entra noutro mundo; e até se chega a ter alguma sensação de segurança, e de repente naqueles 20 metros somos assaltados com panfletos de shows de tango e jantares fantásticos - nos unicos dois restaurantes desse pequeno troço. Com a maior das pintas sim. Mas não dá para não sentir a mascarice da coisa, e quase me senti mal por ali estar, como tomada por idiota. É que La Boca é de facto encantador, no seu género. Mas não naquele género de guia-postal ilustrado, em que nada é real, e é só para turista ver!


Não sei porque me está a sair isto de forma tão aguerrida, mas foi desconfortável passear em todo um bairro sem ter coragem de tirar a máquina fotográfica da mala, e de repente num troço com menos de 20 metros ser tudo perfeito e tudo novo e tudo... fantasia.


Gostei de La Boca, mas da real.


Até porque me voltaram a dizer que tinha pinta de porteña (tese que eu, muito inchada, corroborei, com uma mãe argentina.... sorry mamma, mas pegou, e foi bom para sacudir a pinta de estrangeiros que não bom ter em La Boca).


Gostava de ter mais fotografias, mas não me atrevi.






jueves, 30 de agosto de 2007

breve sinal de vida

Depois de uma semana em exposicao, outra passou, e nela aconteceu mais que tudo até agora. Finalmente comeco a ganhar ritmo, forma nesta cidade, conteudo demasiado para nao ter net em casa e nao poder a toda a hora deixar aqui as minhas histórias... estou no computador da faculdade (tao lento que pede uma piada, soubesse eu alguma, e ficaria o post muito mais composto), sem as fotografias e as minhas "curtas-metragens" (modestos videos de 30 segundos) que tirei para deixar nesta porta, para voces, meus queridos, entrarem um bocadinho.
Para quem dizia que o desligar era inevitavel, desengane-se! Ando doida de ansiedade para finalmente poder aqui deixar tudo o que tenho vivido, numa continuada reportagem completa, com direito a espreitadelas a cidade viva (os tais videozinhos que dedicadamente fui gravando ao longo de muitos passeios), para melhor perceber os meus ares por aqui.
Tenho uma serie de acontecimentos escritos já no meu computador, e guardo-me para quando a internet finalmente chegar a casa (o correio tarda aqui...).
Continuo numa euforia de afazeres interminavel, que isto de comecar uma vida do zero noutro mundo é muito bonito, mas leva qualquer cabeca e orcamento ao rombo! De qualquer maneira, ja temos individuais (que poupam idas ao Mr.Wash), um enorme puff a compor o living, e um kit de limpeza de casa de banho (isto se os meus Anjos leram o papel que lhes deixei).
Já tivemos passagem de duas comitivas portuguesas (Sofia Coutinho& companhia, Rodrigo Rebelo Andrade & Matilde L.Monteiro) no nosso humilissimo lar, que nos deixaram verdes de inveja e doidos de entusiasmo com suas histórias de viagens, aventuras &desventuras, lugares, dicas. Já me passou pela cabeca (Mae desvie o olhar do ecra por 4 linhas) atrasar o curso um semestre e tirar uns meses para me lancar a procura deste continente. Viagem de sonho, curriculo completo, da mais metropolitana Buenos Aires aos pes descalcos e ausencia de electricidade da Bolivia, do deserto no chile á polar Patagonia (again, Mae eu sei que o acento é ao contrario, mas isso ca nao se usa, e terei de me reduzir ao teclado disponivel), as florestas, as cascatas, as montanhas, e a História (meu Deus, a História!!)...

A parte quotidiana da coisa também tem sido uma descoberta, porque se viver com miudas pode ser complicado, viver com 3 rapazes, Anjos, claro, mas tres pecas descontraidas e tao rapazes na desorganizacao e (aquilo a que eles chamam) "desprendimento", pode ser exaustivo, ao nivel do esgotamento nervoso! Enfim, por trás das discussoes sobre comprar ou nao mais copos, deixar ou nao os sapatos no meio da sala, ser preciso ou nao arrumar, vou entendo a Mae na desesperada luta doméstica contra 4 pestes indisciplinadas, vou tentando (sem outro remedio) adocar meu feitio, e - verdade seja dita -, os meus Anjos tratam-me como uma princesa (como adoram gabar-se a visitantes, orgulhosos do cla construido). Cozinham lindamente (tanto sabem, que já passo a vergonha de ser a-que-nao-sabe-cozinhar-mais-que-um-ovo. Felizmente o Francisco acompanha-me nessa ala de ignorancia... mas também, nada que um ano nao possa resolver), e mais importante do que isso, cozinham sempre, o que me dá um certo ar, chegada a hora de "cenar", de dondoca desatarefada, e me faz sentir muito bem mimada (das gambas al aglio a canja de galinha caseiríssima, e nao esquecendo a promessa de bacalhau a Gomes Sá!!).
Por trás também dos inevitáveis choques de natureza, e das irresoluveis incompreensoes quanto a coisas tao basicas como a dimensao e completude das pratas e porcelanas (ou plastico e loica de segunda categoria), sao e tem sido de facto os meus Anjos, e tanto me tratam com o a-vontade de um amigalhaco, como se fosse um deles, como com o cuidado e a ternura da princesa por que me tomam. Um americano já me disse que pareco a mae deles (apanhou-me a dar o sermao da loica ou algo do genero), e quando chamei o miguel com o dedo apontado para ir mudar o o rolo da casa-de-banho riu-se na minha cara e matou saudades da mae.
É inevitável para mim nao assumir a irma mais velha que há em mim, faz tao parte que o faria se vivesse com gente toda mais velha que eu. Bem, eles sao todos mais velhos que eu. Et voilá!
Na boa indisciplina com que sao uns rapazolas, e na comovente atencao que (de vez em quando!) tem comigo, tem sido muito o zé&antonio daqui. E por isso, viver com eles tem uma muito boa familiaridade, e ajuda as saudades de casa. Queres acreditar, Zé, que o mike é tao batuques como tu?? nao queria acreditar quando soube que ele tocava bateria e se aproximou da mesa do jantar...
Falta-me a ala feminina, e entretanto descobri um bom principio dela, mas isso fica para outro sopro, que tenho uma aula agora!!
Adorei todos os comentários (António que bom saber tanto de ti, thanks pelo relato completo), meus queridos sabe-me o mundo ter noticias vossas!! Continuem a escrever-me, quero saber coisas!!

Aqui volto, se Deus quiser, já em casa com internet instalada e toda a informacao disponivel, em todos os formatos possiveis!!

Ah!, e deixo aqui o meu numero de telemovel, desta vez bem!
Aceito sms ternurentos, saudosos, banais, noticiosos, de vez em quando!!
0054 911 6961 4217

até já*

jueves, 23 de agosto de 2007

22 de Agosto

Hoje brindo aos irmãos e à cumplicidade. Às gargalhadas e às piadas secas. Ao barulho, às discussões, aos quartos desarrumados. Aos jantares em familia, ao "já vou" e ao "já fiz isto". Ao amor fraterno que não se confessa.

Parabéns meu puto António!! Doi-me um bocadinho nao estar para os teus 18 (sao os melhores, e todos os que se seguem). Que tenhas um grande ano, meu querido. E que mo vás contando, para nao me sentir tao longe de voces!

Também brindo ao Corto Maltese, às fotografias, às ressacas e às descobertas. Aos moleskines e aos jogos de palavras (uma, rápido, sem pensar!). Aos "até já".

Até já!

Uma semana em exposição.

(escrito há dois dias... estou sem net em casa! vivam as borlas da faculdade!)

Cá estou eu deste outro lado há uma semana. Uma semana de Inverno, uma semana de espanhol, uma semana sem um sofá decente onde estiraçar as pernas. Uma semana sem máquina da loiça ou copos iguais, uma semana sem este e aquele café no meu Príncipe Real, sem a minha malta, uma semana sem tabaco de enrolar, porque aqui não se vendem filtros. Uma semana sem os meus irmãos e a minha Sheilla de todos os dias.
Mas uma semana já com pratos para toda a gente e uma cafeteira novinha em folha, para minha digna sobrevivência. Uma semana a ganhar capacidade de comunicação com os locais (daqui a um mês já domino a gramática e recupero a habitual característica gralha palradora), e uma semana de boas jantaradas.
A primeira foi tuga, logo no segundo dia. Parece que por estas bandas (como por todas as bandas deste planeta, somos como formigas, estamos em todo o lado!) há muitíssimos portugueses, a trabalhar, a tirar o curso, à aventura... Éramos 8 a jantar, e faltavam outros 8, conhecidos deste ou daquele. Os bifes tinham sete centímetros de altura (ok, história real... os bifes tinham sete centímetros de altura!! Nunca visto!!) e a mesa estava bem composta: 4 estudantes por um ano (nosotros), uma a estudar cinema, um a trabalhar pelo programa Contacto, uma que largou tudo em Portugal e se mandou para cá à procura de trabalho e aventura, uma que vive cá a dar aulas de português.
Não sei se foi por estarmos todos longe de casa, ou porque português é mesmo assim, mas a conversa, o convívio e a palhaçada, rolaram sem gelo, e apesar do cansaço acusado cedo – que 4 horas de diferença e algumas noites mal dormidas e bem animadas (boas despedidas, boas memórias... thanks por elas, parti com um ânimo especial) em vésperas de partir, deixam a sua marca -, a noite caiu bem e foi suave entrada nesta vida argentina.
A segunda jantarada foi agradavelmente espontânea, e talvez por isso, divertida na surpresa com que aconteceu. Na noite anterior tinha estado num bar com umas maltas da minha faculdade (ainda não criei grandes laços nessa banda, mas são estes dias de início, e a ver vamos), e um francês porreiríssimo (Laurent, seu nome; não está em Direito e não faço a mínima ideia como foi lá parar, mas foi entre ele, um brasuca do Rio de Janeiro, Leonardo, e moi même, que a conversa rolou. Sobre política, sobre cidades, sobre diferentes sociedades e distintos hábitos culturais que cada um trazia consigo. Numa perspectiva muito prática e nada pseudo-intelectual. Boa conversa, a encher as medidas e a bagagem!) desafiou passeio pela cidade no dia seguinte para conhecer alguns cantos à casa.
Lá fomos, eu e o Laurent, os meus Anjos, e uma outra francesa (porreiríssima também), Cecília. Cansativo à brava, que a cidade é de facto um mundo, e um dedo neste mapa não é o mesmo dedo noutro mapa qualquer, e o que parece ser “já ali”, fica a bons minutos a pé.
Depois de uma caneca quente a consolar o frio dos dedos e a praia de há uma semana atrás (café, natas, chocolate e baileys, bom conforto!!), vamos jantar??
Pizzas e vinho barato, jogos de cartas e muita música, no chão da nossa modesta sala – que o que temos mais próximo de um sofá é um colchão coberto com uma manta e muitas almofadas... isso, e uma bóia insuflável a fazer de poltrona! -, foi uma noite do melhor, bem ao jeito erasmus, pela pobreza do contexto físico, e riqueza do humano. Acabámos todos a noite em casa da tuga de cinema (Catarina também), à luz das velas, entre brindes, danças, converseta, e muito bom convívio.
Ontem tivemos a terceira jornada nestes campos: uma argentina amiga de uma amiga de não sei quem (por aqui não interessa muito como se conhecem as pessoas ou como se têm os contactos. Conhecendo ou tendo-os, fala-se, combina-se, conhece-se melhor, e pronto. Estamos todos no mesmo barco, todos queremos conhecer novas gentes, porque estamos todos longe das nossas), veio cá a casa jantar com uma amiga. Comeram-se, para variar, bons bifes (é impossível não comer bom – muito bom!! - bife aqui, a carne é óptima e barata! Como nos dizia o nosso taxista-postal, por mais pobres, por maior crise, carne há sempre, e buenissima!!), o meu arroz saiu empapado, o que me valeu a vergonha de ser a pior na cozinha em casa de homens (o Fran chega-me aos calcanhares, mas o Mike e o Johny têm pinta de bons cozinheiros... chato!), não havia cadeiras para todos (recorremos ao balde do lixo virado ao contrário e à mala Samsonite do Fran), mas a conversa foi óptima, corrida, e aprendemos cinema argentino, festivais próximos, concertos porreiros e bandas de rock argentino na berra. Mostrámos-lhe fotografias de Lisboa e o nosso Fado. Falou-se da Argentina, da Europa, de Portugal, de bares e bolichès (= discoteca, por aqui), de palavras proibidas e hábitos portenhos (portenho: local de Buenos Aires). Ficou a promessa de outro jantar, desta vez em casa delas. Ana e Suzy, umas porreiras. A primeira, cenógrafa, a segunda, socióloga.
Estou eufórica por me terem já duas vezes dito que tenho “pinta de argentina”!! Se isso não for coisa boa, pelo menos integro-me bem no meio.
Não será muito estranho, porque as gentes daqui são muito parecidas com as portuguesas. As velhinhas e as senhoras, os mitras e os vendedores dos quiosques, não estranho os traços, podíamos ser nós.
Mas também, a Argentina tem chapadas na comida, no falar, nos hábitos (a noite, por exemplo, começa tão estupidamente tarde como em Portugal. O francês estranhou, nós não. A diferença é que aqui há 200 boliches, e a dificuldade estará em escolher, como em Lisboa não acontece) a cultura italiana e a espanhola, e nós não somos muito diferentes, em comparação com o resto da Europa. Talvez sejamos até mais parecidos com os argentinos e seus hábitos, que com os espanhóis e italianos.
Outra delícia argentina, falando em hábitos: os homens falam-se de beijo na cara, para grande incómodo dos meus Anjos, que o estranham, em sua portuguesa masculinidade. Eu derreto-me, e rio-me.
Hoje vou à faculdade, começar as aulas enfim.
Mas isso fica para outro relato.
Tenho de sair de casa, a ver se já consigo levantar dinheiro (ando a viver há 3 dias com pouco mais de 3 euros). Oxalá consiga, tenho de comprar meias!

lunes, 20 de agosto de 2007

Anjos de Charlie







Meus companheiros,meus anjos de Charlie, como lhes chamou uma argentina. Irmãos de viagem, de casa, de noites, e do mais que vier.


Da descoberta do lugar e das pessoas, das manhãs acordadas, das compras de supermercado e das contas à vida.


Damo-nos com a naturalidade de quem se conhece há anos; há uma boa cumplicidade nascida do simples facto de estarmos juntos nisto, e acrescida em cada nova parvoíce.


Da esquerda para a direita, Miguel, Francisco, Joao. Mike, Fran, Johny.


Meus companheiros, grandes companheiros!




domingo, 19 de agosto de 2007

Cidade

Vou descobrindo uma beleza urbana diferente da que estou habituada e apaixonada à partida. Não encontro aqui as minhas ruelas desordenadas, irreverentes à medida em que cada uma quis crescer, sem disciplina, cruzadas, labirínticas, ziguezagueando em subidas absurdas e traço sem sentido. Não há nas janelas as vizinhas e os gatos, os estendais sem pudor, as varandas que se tocam sem respeito pela intimidade. Não há os jardins semeados de velhos a jogar cartas, nem pombos, nem qualquer sinal da Lisboa antiga, cidade-quintal minha, cidade em ponto pequeno e familiar na dimensão.
Aqui tudo é enorme, urbano, desconhecido até para quem pertence, porque a cidade não tem fim. Não há o escape acolhedor de um bairro alto, vizinho. Não há essa portuguesa pequenez, vizinhança. Tudo está numa maior escala do que podia ter noção.
Aqui tudo é Cidade.
As ruas são largas e não são ruas; avenidas. Comportadas na geometria irrepreensível, sua matemática lógica. O desenho da cidade é civilizado e não permite descidas da Glória ou teias de Alfama. A cidade adivinha-se em traço de olhos fechados. E no entanto, sua irreverência vive noutra perspectiva, porque tudo corre e tudo vibra, e em cada larga avenida, o que se perde em rectidão de espaço se ganha no ritmo frenético das pessoas que não deixam dormir os passeios, nas luzes dos letreiros das lojas, hotéis, restaurantes, bares, cafés, quiosques, livrarias… e dos carros, dos táxis e dos autocarros, que parecem andar às voltas, porque não acabam no sinal verde que abre – que por falar nisso, para os peões, não é verde, é branco.
Há um imparável movimento, sem aqueles 2 instantes de quietude que de vez em quando sinto em Lisboa, quando por um instante não passa carro algum, e por outro não vejo vivalma.
Aqui não.
Dou por mim a flirtar com essa visão de transito selvagem, de grande metrópole, e no entanto, tão latino na indisciplina com que não importam as faixas (parecem manadas de gnus, alguém viu o Rei Leão??).
Dá vontade de acelerar o passo e entrar nesse ritmo vibrante, apanhar um táxi (brancos, pretos, amarelos… a tarifa inicial são 50 cêntimos, e pode ir, imaginem, até aos 4 euros!) e galopar a cidade, acelerar até ao fim da avenida, ganhar essa pressa descontraída e correr, correr, correr.
Dou por mim a flirtar com esta cidade que existe num traço que nada tem a haver com aquilo que me prende a Lisboa, e a todas as cidades que me receberam. Com o sentido urbano que não conhecia. Com a Cidade.



meu quarto argentino

Doce pobreza... mas muito acolhedor!! O tal estilo rustico-moderno, num genero muito cool!

viernes, 17 de agosto de 2007

Resumée de uma Chegada

Este Ar vai a pensar nas almas atormentadas com a minha Fortuna, desde essa fatídica (magnânime!! Obrigada pelo bom “momento perfeito” que me deixaram) despedida. Em falta de comunicação atempada e em cima do acontecimento Chegada aqui ficam uns lampejos.

Buenos Aires. 1 da manha. Aterragem, duas horas atrasada. O que não calhou nada mal, porque eu e o Francisco decidimos solidariamente (ou medrosamente, afinal quem se quer atirar para o centro de uma cidade desconhecida e monstruosamente grande com 70 kg de malas, sem destino??) esperar pelos outros dois mosqueteiros que vinham no voo das 6 da manha.
Reunida a grupenga, passada a 1ª hora de boa parvoeira e atrofio, cambiados os euros (e neste momento passámos de remediados a muitíssimo abastados!!), táxi para A Cidade, a 30 km. Veio o primeiro cheirinho a Buenos Aires!! Taxista ao jeito de bom velho argentino (em boa verdade, nunca vi nenhum, mas este era um postal!), boina na cabeça, voz cantada (“Ai Dios! Que riso! Ai Dios!”), conversa fiada e corrida, as mãos em todo o lado menos no volante (gesticulava, apontava, parecia dançar!!), a apresentação em 40 minutos de uma Argentina por descobrir. Uma delicia!! Passei a saber (saibam também) que aqui não se paga ensino e saúde, que a cidade tem “12 milhões de pessoas e 1 milhão de travestis” (“Hay que tener cuidado e no se enganar! Ai Dios!”), que há uma comunidade portuguesa em Buenos Aires e que a carne é muito boa, “la que se come y la que anda!”!!
Brejeirice aparte, e esquecendo que quase nos íamos espetando porque enquanto gesticulava, o taxista também decidiu procurar uma fotografia na carteira para nos mostrar (… com as duas mãos!), aquela voz cantada e incansável soube mesmo a chegada.
Aí estávamos nós!
E aí começavam também os problemas.
Problemas: o senhorio é uma miudeca de 30 e alguns anos, e uma desconfiança de quem tem 70 e tem barras de ouro debaixo do colchão. Não bastante a inflacção ter subido os preços em 40% desde o ano passado, exigiu-nos na hora e em cash uma caução de 12 000 pesos (2500 euros), sob pena de não podermos assinar o contratgo e logo (lógica da batata) não podermos dormir na casa nessa noite; e isto desconsiderando já os 800 pesos que já tínhamos pago como reserva, e os 6 000 que em contas e buscas as carteiras conseguimos reunir, mas que não chegavam como entrada. Agravante: nenhum de nós tinha ainda dinheiro disponível no cartão, e mesmo que tivéssemos, tínhamos um limite máximo para levantar. Nada feito. Ou isso ou um fiador. A alternativa era pegar nos mesmos 6000 que “não chegavam” e ir ao melhor hotel da cidade para desforrar o stress de todo um dia. A agravante II era que nenhum de nós tinha telemóvel com roaming ou net para falar para casa a pedir dinheiro ou amizades argentinas para ter fiador.

Um filme… tudo se resolveu, e assinámos hoje o contrato de alquiller, sobre o olhar critico e atento desta ignorante jurídica!
A Casa??
Uma casca de noz, um mimo ao jeito Erasmus. Sofás, zero; camas, zero; só dois colchões no chão a dar um ar rústico-moderno. 3 cadeiras e 4 mesas (alguém me explica??). Umas almofadas cor de nada no chão da sala, uma cozinha casca de noz, do tempo da avozinha, e uma casa-de-banho igualmente mimosa. Dois quartos óptimos, e um outro ridículo até para uma despensa. E um kit cozinha modestamente composto por três pratos, três copos, uma panelita…. E é tudo!
Mas não deixa de ser um mimo de casa, e… é a nossa!!

Aqui começa

Meus queridos,
Eis que parto, de facto. Com medo de não vos ter comigo, e a vontade de me ver atirada num mundo que não conheço. A ver como me safo. Naturalmente, com a vontade de conhecer esse outro lado do Mundo, onde só posso ir a solo (sorry guys!).
Levo-vos da melhor maneira que posso, e mais não digo, que a partir desta afirmação todos os caminhos são pirosos, e o problema de se escrever é que esse tipo de embaraços públicos fica gravado para a posterioridade, sem retorno, contorno, ou defesa possível.
Mas levo-vos comigo, agarrados ao que sou.
Aqui vos deixo uma porta para espreitarem o que vou viver, das coisas mais pequenas e tão miserável - quanto deliciosamente - quotidianas, aos grandes relatos, discursos & divagações, iluminados e reveladores, ou só... chatos. Não me levem a mal, não? Estou longe de casa e tenho direito a uma quota de lamechice/mariquice acrescida!
Aqui vos deixo uma porta, meus queridos.
Aqui começa o romance entre moi même e a grande Buenos Aires.